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A CULTURA É UM DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL

  • Foto do escritor: Dra Luciana Rocha Narciso
    Dra Luciana Rocha Narciso
  • 6 de out. de 2022
  • 6 min de leitura

Atualizado: 6 de dez. de 2022

Deixo aqui, em forma de artigo, o item 1.5 integrante da Dissertação de Mestrado que defendi no Programa de Políticas Públicas da UFPR sob o título de “Políticas Públicas como instrumento de realização dos Direitos Culturais previstos na Constituição Federal de 1988”. Para tanto realizei um estudo de caso acerca da situação da Leitura no Brasil. Hoje, passados quase sete anos da entrega/aprovação de minha dissertação, percebo a importância de abrirmos uma séria discussão acerca desse tema! Segue abaixo o item acima mencionado!



Os direitos culturais, meados do século XX, foram elevados à categoria de Direitos Humanos Fundamentais, tendo sua proteção determinada primeiramente pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, adotada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas, que estabelece que se deve “conjugar o catálogo dos direitos civis e políticos ao catálogo dos direitos econômicos, sociais e culturais”.

Os Direitos Humanos tiveram seu processo de reconstrução no período posterior à Segunda Guerra Mundial, como defesa às barbáries praticadas pelo totalitarismo, representado mormente pelo nazismo e pelo fascismo, quando milhões de pessoas morreram em razão do genocídio concebido como projeto político idealizado por Hitler, entre outros. (SACHS, 1998 p. 149)


Essa passagem é relevante uma vez que, além do genocídio, ocorreram simultaneamente saques e destruição ao patrimônio cultural dos países ocupados, com o objetivo de anular a identidade dos povos dominados, o que conduziu à necessidade de regulamentar de forma escrita a importância destes direitos.

Em outros termos, tais direitos devem ser preservados e protegidos porque ao aniquilar as práticas culturais de um povo, se está aniquilando sua identidade.


A concepção contemporânea de direitos culturais, devido a essas recentes questões históricas, partiu da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, doravante denominada simplesmente Declaração, que estabelece uma relação de direitos sem os quais o ser humano não pode desenvolver plenamente suas potencialidades físicas, morais e intelectuais.


Desde então, os Direitos Culturais compreendem uma classe de direitos sem os quais o ser humano não pode desenvolver-se plenamente porque a normatização internacional acerca dos Direitos Humanos os integrou ao seu rol de direitos protegidos, desde o início.

A Declaração, marco histórico do século XX sob o ponto de vista normativo dos Direitos Culturais, tornou-se reconhecida mundialmente como o documento que enuncia uma definição universal da dignidade e dos valores humanos (e, portanto, dos direitos culturais que também encontram guarida na Declaração), sendo desde então o modelo padrão que possibilita determinar até que ponto são respeitadas, ou não, as normas internacionais de proteção desses direitos.


Em termos institucionais, em 1946 foi criada a UNESCO (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization), Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, com sede na França; com o objetivo desde então de contribuir para o desenvolvimento em vários países do mundo pela via da educação, ciência, cultura e comunicações. Dentre suas metas, destaca-se, segundo ela mesma, a de orientar os povos para uma administração do seu próprio desenvolvimento por meio dos valores culturais, a fim de poderem ter acesso às benesses da modernização, sem que percam a identidade e a diversidade culturais das quais são detentores.


As atividades culturais desenvolvidas pela UNESCO buscam a proteção do patrimônio cultural, sobretudo mediante o estímulo à criação, à criatividade e preservação das entidades culturais e das tradições orais, e por meio da promoção dos livros e da leitura. Seu objetivo é criar mecanismos para reduzir o analfabetismo no mundo.


O direito à livre participação na vida cultural encontra-se igualmente previsto na Declaração Universal de Direitos Humanos, em seu artigo 27, que preceitua: "toda pessoa tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de gozar das artes e de aproveitar-se dos progressos científicos e dos benefícios que deles resultam”.


Sob o ponto de vista jurídico operacional, contudo, a Declaração consiste, oficialmente, num documento que contém intenções e programas que servem tão somente como instrumento norteador, no sentido de promover o reconhecimento dos direitos culturais em termos universais, inspirando a redação de outros tratados, acordos, cartas e Constituições, como se verá abaixo.


Entretanto, não possui força normativa, não podendo, assim, ser efetivada de plano sem que haja regulamentação complementar interna sobre o tema por parte dos países. Novamente, nesse aspecto, ressalta-se a importância da CF88 ter regulamentado a obrigação do poder público em proporcionar ao povo o acesso aos direitos humanos fundamentais, incluindo em seu rol, os direitos culturais.


Ainda sobre a normatização internacional, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) foi redigido em 1966, tornando-se o instrumento pelo qual os Estados membros da ONU (Organização das Nações Unidas) firmaram compromisso, em obediência aos termos do artigo 15, de "respeitar a liberdade indispensável à pesquisa científica e à atividade criadora" e a adotar medidas "necessárias à conservação, ao desenvolvimento e à difusão da cultura". A difusão da cultura mencionada neste artigo é uma prática que, quando proporcionada ao cidadão, concede a possiblidade de acesso da população aos bens e direitos culturais. A difusão, desde então, está expressamente relacionada à questão do acesso.


Já no artigo 1º, o PIDESC antecipa que “Todos os povos têm o direito a dispor deles mesmos. Em virtude deste direito, eles determinam livremente o seu estatuto político e asseguram livremente o seu desenvolvimento econômico, social e cultural. Nesse artigo, como se vê, o desenvolvimento cultural está relacionado ao exercício da liberdade política e à autonomia dos povos.


O PIDESC, reconhece, no seu preâmbulo, que, em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o ideal do ser humano livre, liberto do medo e da miséria não pode ser realizado a menos que sejam criadas condições que permitam a cada um desfrutar dos seus direitos econômicos, sociais e culturais, bem como dos seus direitos civis e políticos.

Esse documento iguala a importância dos direitos culturais à dos direitos civis e políticos, como direitos humanos fundamentais ao desenvolvimento e à dignidade humana.


Outro documento relevante para a proteção dos direitos culturais, é o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, também do ano de 1966, que trata da livre expressão do pensamento assegurando a todos "a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, em forma impressa ou artística, ou qualquer outro meio de sua escolha". Nesse Pacto, os direitos culturais estão incluídos no rol de direitos civis e políticos de qualquer cidadão livre.


Vale esclarecer que se excluem dessa “livre expressão” as situações ou manifestações que envolvam a reputação ou dignidade de outras pessoas, as questões de segurança nacional e os atos contrários aos princípios basilares dos direitos humanos, como, por exemplo, a veiculação de propaganda a favor da guerra ou a incitação ao ódio nacional, racial ou religioso, expressamente dispostos nos artigos XIX e XX do referido documento. O direito à difusão, novamente, é relacionado ao direito à informação, que pressupõe participação e também acesso.


Na esfera do Direito Interamericano, os direitos culturais estão indicados no Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, mais conhecido como Protocolo de São Salvador, de 1988. Este, no artigo 13, assegura o direito à educação e, no artigo 14, estabelece o direito aos benefícios da cultura, reconhecendo aqueles que decorrem da promoção e do desenvolvimento da cooperação e das relações internacionais em assuntos científicos, artísticos e culturais e, na mesma linha, compromete-se a propiciar maior cooperação internacional.


Ainda dentro do âmbito do Direito Interamericano, vale mencionar ainda o Pacto de São José da Costa Rica, também conhecido como Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969, e a Carta Democrática Interamericana, de 2001, que são documentos que expressam a relevância da atuação dos Estados para a garantia dos direitos culturais.


Em 1985 foi realizada no México a Conferência Mundial sobre Políticas Culturais da qual resultou um documento conhecido como “Declaração do México”, que estabelece os princípios que devem reger as políticas culturais – que serão apresentados neste estudo por ocasião da problematização acerca das Políticas Públicas de Cultura.


No movimento de universalização dos direitos humanos foi realizada a II Conferência Mundial de Direitos Humanos em Viena, no ano de 1993, com o objetivo de avaliar as conquistas mundiais no campo destes direitos e ampliá-las, principalmente no que concerne ao reconhecimento da indivisibilidade e da interdependência presentes entre as diversas espécies de direitos humanos, constantes no seu artigo 5º, a seguir: “Todos os Direitos


Humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e interrelacionados. A comunidade internacional deve considerar os Direitos Humanos, globalmente, de forma justa e equitativa, no mesmo pé e com igual ênfase”. (ONU, 1993).


Em 2001, ainda na esteira da defesa dos direitos culturais, foi adotada pela UNESCO a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, durante o processo de implementação mundial dos direitos culturais, que afirma os direitos das pessoas pertencentes às minorias à livre expressão cultural observando, contudo, que ninguém poderá se utilizar da diversidade cultural para violar os direitos humanos nem tentar restringir o seu exercício.


Outros documentos internacionais que instituem a proteção e o acesso aos bens e direitos culturais que versam sobre a proteção internacional destes direitos, são:

• Convenção Universal sobre Direito de Autor (1952),

• Convenção sobre a Proteção dos Bens Culturais em caso de Conflito Armado (1954),

• Declaração dos Princípios da Cooperação Cultural Internacional (1966),

• Convenção sobre a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural (1972),

• Recomendação sobre a Participação dos Povos na Vida Cultural (1976),

• Recomendação sobre a Salvaguarda da Cultura Tradicional e Popular (1989)

• Informe da Comissão Mundial de Cultura e Desenvolvimento denominado "Nossa Diversidade Criativa" (1996),

• Declaração de Friburgo, sobre os direitos culturais, adotada em Friburgo, por um grupo de estudiosos do tema, convocado pelo Instituto Interdisciplinar de Ética e Direitos Humanos da Universidade de Friburgo – Suíça. (2007).

 
 
 

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